19/11/2023

João Calvino e Charles Spurgeon jamais foram ordenados ao ministério da Palavra



Caricaturas que desenhei do João Calvino e 
do Charles Spurgeon anos atrás.

Eu nunca tive interesse por biografias, um erro em correção. 

Se lêssemos mais sobre irmãos do passado, aprenderíamos muito mais sobre virtudes do passado e sobre os vícios do presente.

Eu não sabia, e descobri agora, que Charles Spurgeon, chamado de "o príncipe dos pregadores" por seus admiradores (um título que ele desprezaria) era contra a pompa que muitos líderes apreciam ter, e que recusou ser ordenado como Ministro da Palavra, assim como recusou o modo de tratamento "reverendo", pois para ele essas coisas seriam como um tipo de sucessão apostólica e um tipo de papado que impõe distinções entre duas classes de crentes, a classe sacerdotal dos ordenados (o clero) em distinção do restante do povo de Deus - e essa distinção não existe nas Escrituras.

(As imagens são de uma postagem onde vi essa questão da não ordenação de Spurgeon e as caricaturas que fiz de João Calvino e de Charles Spurgeon há alguns anos.)

P.S.- João Calvino, o reformador de Genebra cujo nome define a teologia Reformada "Calvinista" também não foi ordenado ao pastorado e jamais desejou prestígios. Estevão e Felipe foram separados para a diaconia na Igreja em Atos 6, e na sequência do texto eles foram descritos como pregadores (evangelistas) sendo Estevão o primeiro mártir da igreja (Atos 7) e Felipe batizava (Atos 8: 38) - um rito hoje restrito à administração de ministros ordenados apenas, mas que na Bíblia era praticado também por evangelistas - que no caso eram diáconos, crentes separados para cuidar dos necessitados dentre a congregação dos crentes, mas que TAMBÉM, além disso, pregavam o Evangelho (e batizavam?).

Esses casos seriam "excessões"? Ou será que as tradições dos homens se impuseram à religião para subordiná-la às invenções dos novos tipos de classes sacerdotais a fim de fazer da igreja, como instituição, algo administrável pelos poderes humanos e, assim, restritora das ações dos crentes comuns nos serviços ao Senhor?

Oras! A Igreja tem um Rei e Cabeça (o Senhor Jesus Cristo, um Rei incorruptível em claro contraste com as autoridades humanas e suas fraternidades do erro) que exerce o seu senhorio pelo Espírito Santo, que distribui seus dons como lhe apraz.

E quais são as implicações de termos uma classe distinta clerical dos demais crentes comuns? O vicariato. Não importa o que a Bíblia diz ou ensina, e sim o que seus intérpretes ordenados dizem a seu respeito, quer acertem ou errem, eles têm autoridade atribuída que se faz intrínseca. Nesse sistema mediado por homens somente os ordenados têm autoridade, legitimidade e prerrogativas nas interpretações e nas aplicações das Escrituras. Reina, nesse sistema, a máxima "o pastor disse!", pouco importando o que a fonte primária diz. E se um não ordenado lê as Escrituras de forma mais fiel à ortodoxia ele é facilmente ignorado ou descartado porque não tem a legitimidade dos ordenados. Nesse caso a autoridade das Escrituras fica condicionada ao que o clero diz sobre ela. Essa autoridade é diminuída, aprisionada e manipulada por intermediários com seus interesses - muito embora Palavra de Deus esteja disponível a todo o povo de Deus, à Igreja, sem nenhuma mediação humana (o que é diferente de ensinar) pois a única mediação verdadeira entre as verdades de Deus e nós é a mediação eficaz de Cristo exercida pelo Espírito Santo.

Sobre o sacerdócio universal dos crentes:

"Mas vós sois a geração eleita, o sacerdócio real, a nação santa, o povo adquirido, para que anuncieis as grandezas daquele que vos chamou das trevas para a sua maravilhosa luz; vós que outrora nem éreis povo, e agora sois de Deus; vós que não tínheis alcançado misericórdia, e agora a tendes alcançado."

(1 Pedro, 2: 9, 10)

https://cpaj.mackenzie.br/recursos/historia-de-igreja/artigo?tx_news_pi1%5Baction%5D=detail&tx_news_pi1%5Bcontroller%5D=News&tx_news_pi1%5Bnews%5D=24224&cHash=c1aa64b710f3998d2fe3887187afdbda

https://romulomonteiro.blogspot.com/2012/09/maos-vazias-spurgeon-e-ordenacao.html?m=1

https://www.monergismo.com/textos/chspurgeon/24_fatos_spurgeon.htm

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O Sacerdócio Universal de Todos os Salvos 

Ordenação clerical

Série: Os Grandes Princípios Batistas 

6 - O Sacerdócio Universal de Todos os Salvos

Desde o início, os batistas partilharam com os vários grupos insatisfeitos com o protestantismo e com os separatistas, os insatisfeitos da Igreja da Inglaterra, a rejeição de um clero. Isto é o que se chama “a doutrina do sacerdócio universal de todos os salvos”. Num certo sentido, não temos sacerdotes entre nós. Isto no sentido de alguém com mais acesso a Deus do que os demais. Noutro sentido, todos somos sacerdotes porque todos temos acesso a Deus, sem necessidade um mediador humano.

O pastor não é um sacerdote. Sua oração vale tanto, aos olhos de Deus, como a oração do zelador da igreja, desde que este seja crente. A oração do crente é ouvida por causa da graça de Deus, da mediação de Jesus e da intercessão que o Espírito faz por nós, junto à Trindade. A identidade batista é fortemente marcada por esta concepção teológica: o sacerdócio universal de todos os salvos, em conseqüência do livre acesso que todos nós temos à presença divina.

No entanto, esta doutrina tão valiosa está sendo diluída em nosso meio. Isto sucede por causa do entendimento de que temos um clero e um laicato. Todos nós somos ministros, pois todos somos servos. E todos somos leigos, porque todos somos povo (é este o sentido da palavra “leigo”, alguém do povo). Não temos clero nem laicato, como batistas. Somos todos ministros e somos, todos, povo. Mas isto tem sido esquecido, porque, cada vez mais, a igreja mergulha no Antigo Testamento e não no Novo. Usamos os termos do Novo com a conotação do Antigo. Muita gente prega o Antigo Testamento sem analisá-lo pelo Novo Testamento. Assim, o pastor do Novo Testamento passa a ter a conotação do sacerdote do Antigo Testamento. É o “ungido”, o detentor de relação especial com Deus que os outros não têm. Só ele pode realizar certos atos litúrgicos, como se fosse o sacerdote do Antigo Testamento. Por exemplo, batismo e ceia só podem ser celebrados por ele. Assumimos isto, mas não é uma exigência bíblica. Convencionamos isto.

No meio carismático isto é mais forte. Os pastores tornam a igreja dependente deles. Só eles têm a oração poderosa, a corrente de libertação só pode ser feita por eles e na igreja, só eles quebram as maldições, etc. O sentido teológico do sacerdote hebreu permeia o sentido teológico do pastor neotestamentário. Isto convém ao pastor neopentecostal. Ele se torna um homem acima dos outros, incontestável, líder que deve ser acatado. Tem uma autoridade espiritual que os outros não têm. Ele tem uma linha vermelha com Deus. Ora, se há algo que aprendemos sobre a liderança nos dois Testamentos, é que o Antigo elitiza a liderança e o Novo a democratiza. Para o neopentecostal, o Novo Testamento, a mensagem da graça e a eclesiologia simples, despida de objetos, palavras e gestual sagrados não são interessantes. Assim, ele se refugia no Antigo Testamento. Por isso há igrejas evangélicas com castiçais de sete braços e estrelas de Davi no lugar da cruz. Outras desfraldam a bandeira de Israel (e omitem a brasileira), guardam festas judaicas, e têm incensários em seus salões de cultos. Há evangélicos que parecem frustrados por não serem judeus. A liturgia pomposa do judaísmo é mais atraente e permite mais manobra ao líder que se põe acima dos outros. E com isso, os membros da igreja são os ajudantes do obreiro.

Em Portugal, um diácono, conversando comigo, queixou-se da mentalidade católica infiltrada nas igrejas batistas. O pastor era um sacerdote e os diáconos, seus coroinhas. No meio neopentecstal, parece que o pastor é um executivo espiritual e os membros, os pagadores de contas. Lutero tentou apagar o conceito católico de que a Igreja era a liderança, o clero. Para ele, igreja era o povo e não a instituição, representado por seu clero. Ele não gostava da palavra kirche para igreja, porque enfatizava a instituição. Preferia gemeinde, que dá a idéia de comunidade. Ele queria a ênfase no povo. O povo é a igreja e o povo é sacerdote. Não há pessoas credenciadas para terem mais acesso a Deus, em detrimento de outras. Não há sangue azul espiritual nem uma plebe espiritual. Deus trata seus filhos por igual, por causa da pessoa de Jesus Cristo.

Tudo isto pode ser resumido no expediente de um boletim de uma igreja batista dos Estados Unidos. Lá constava: “Ministros da Igreja: todos os crentes. Auxiliar dos ministros: o Pastor da Igreja”. Deus não deu a tarefa de fazer a obra aos pastores, a não ser a tarefa de serem pastores. A tarefa de fazer a obra foi dada à Igreja como um todo. E o Espírito foi dado a todos e não apenas aos pastores.


Nota: Preparado pelo saudoso Pr. Isaltino Gomes Coelho Filho, para um congresso doutrinário em Altamira, Pará, novembro de 2009.

Fonte: História dos Batistas:

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