Toda padronização de comportamento que é imposta às pessoas
é uma forma assustadora de imposição de poder sobre os outros. É uma tirania de
quem pensa ser dotado de uma autoridade superior para manipular a consciência
alheia.
Nessa prática, infeliz e muito comum em ditaduras por todo o
mundo e por toda a história, o próximo é diminuído à condição de subalterno e o
opressor é elevado à condição de classe superior com direitos privilegiados.
Nessa prática a consciência humana é usurpada e dá lugar à robotização, à
idiotização, à mera repetição irrefletida de proposições elaboradas por outros
e à dependência intelectual de quem acaba ditando as normas. Nessa prática fica
fácil identificar quem não está alinhado ao poder imposto e seus insubordinados
são logo punidos com toda sorte de disciplinas, incluindo seu banimento e sua
desumanização.
O que me perturba é que muitas vezes os agentes dessas
padronizações dizem que estão buscando o bem comum, mas erram porque o bem
comum inclui a diversidade de culturas, a diversidade de modos e das mais
variadas leituras de um mesmo quadro.
E nesse dilema está a Igreja, promotora da vida, do
conhecimento de Deus e da liberdade. Ela lida com valores absolutos (Deus,
vida, morte, pecado, verdade) e está plantada no mundo dos homens com todas as
suas diversidades. A Igreja não pode abrir mão dos seus valores, não pode
relativizá-los, não pode se prostituir. Para isso ela precisa saber quais são
realmente os seus valores e quais sãos suas prioridades, qual é o seu papel.
Cristo deve ser proclamado e sua Graça é multiforme e isso é muito maior do que
todos os costumes, maior que toda variedade cultural, maior do que todas as
formas como os diversos agrupamentos humanos, em todos os variados contextos, absorvem
seus valores absolutos e se reorganizam ao redor desses valores e, por
conseqüência, é muito maior que quaisquer instituições, que nada mais são do
que ajustes humanos encontrados para organizar certas coisas. Por isso a Igreja
não deve se pautar em valores meramente institucionais e não deve impor por
constrangimento verdades às consciências e às liberdades individuais, pois esse
é o papel exclusivo do Espírito Santo, o verdadeiro convencedor dos corações
acerca do pecado, do juízo e da justiça. A Igreja deve apenas proclamar a
Cristo e os cristãos devem amar as pessoas incondicionalmente.
Somos limitados e falíveis e, portanto, nossas proposições
derivadas de valores absolutos sempre refletirão nossa finitude - mas eu vejo
beleza nisso! A beleza de podermos encontrar segurança, não no que somos ou no
que fazemos, mas na verdade que transcende nossa realidade, no absoluto em
pessoa, na intervenção divina em nossas limitações, num milagre salvador pelo
qual nossa alma clama:
"E o Verbo (Cristo) se fez carne, e habitou entre nós, e vimos a sua glória, como a glória do unigênito do Pai, cheio de graça e de verdade." (João 1:14)