A CERTEZA DA SALVAÇÃO
(mais um texto que saí escrevendo impulsivamente e que sei, será ignorado. Mas está aí, jogado ao vento para, queira Deus, edificar alguém...)
É uma tolice a ênfase que alguns segmentos cristãos dão ao tema da "certeza da salvação" como critério de validação de um verdadeiro crente que foi salvo pelo Senhor.
Por causa dessa ênfase pratica-se a distinção de crentes e inevitavelmente inculca-se certo orgulho religioso naqueles que consideram a si mesmos como mais aptos por cumprirem certos requisitos para fazerem parte do "clube dos distintos" por meio de um conceito equivocado para tornar-se membro de alguma igreja ou para passar pelo batismo.
É tolice e é equívoco esse conceito requisitório de "certeza da salvação" porque ele faz com que a pessoa valide se sua fé é verdadeira ou falsa ao olhar para si, para o seu testemunho, para a sua conduta moral e também para alguma experiência "espiritual" que teve com o Senhor e que o levou à conversão.
Já vi comunidade cristã impedir um crente, da mesma denominação, de participar de um trabalho evangelístico porque aquele irmão poderia não cumprir certos requisitos que aquela comunidade convencionou. Como saber se aquela pessoa era uma verdadeira salva? Na dúvida, pois não a atestamos, a excluímos.
É verdade que todo crente verdadeiro tem suas próprias experiências com Deus, e nisso podemos incluir a experiência de conversão, mas não pode ser coisa verificável a confiabilidade de algo essencialmente subjetivo e normalmente emocional.
Além disso, escrituristicamente, quando foi a conversão do Apóstolo Pedro, por exemplo? Foi quando o Senhor Jesus o chamou da pescaria para o seguir? Ou foi quando Pedro confessou quem o Senhor realmente era, o Cristo, o Messias? Ou foi quando, depois de ter negado horrivelmente ao Senhor, Pedro foi pelo Senhor restaurado? Ou foi no Pentecostes de Atos 2? Atestar a conversão e reduzí-la a um evento é tentar colocar numa caixinha ou numa planilha algo grande demais que não cabe em nada disso.
A verdadeira conversão ao Senhor Jesus é aquela que nos faz crer nEle, é a que nos faz considerar a sua Palavra como Verdade - como de fato é. Os conceitos teológicos da regeneração e da santificação são muito úteis e necessários, mas quando são aplicados nas histórias das nossas vidas nós nunca teremos um progresso linear que se encaixe em padrões e em cartilhas, pois o nosso caminho de fé é pessoal e inclui muitos altos e baixos, cair e levantar, sucessos e fracassos que no conjunto da obra, na perseverança no caminho, atesta-se o cuidado constante do Supremo Pastor sobre os seus. Então o que valida se alguém pode ou não ser aceito numa igreja como membro comungante ou para se submeter ao batismo para assumir-se discípulo do Senhor Jesus não são as nossas experiências espirituais pessoais (que podem ser fraudadas ou até mesmo despercebidas), coisa que difere de pessoa para pessoa, mas sim e unicamente, o que realmente valida um crente é a sua fé no Senhor baseada nas Escrituras, é crer de todo o coração no quanto a vida e a obra do Senhor Jesus são verdadeiros, é acreditar de verdade no que Deus fez por nós através do Senhor Jesus na cruz e no quanto o seu sacrifício vicário é eficaz para resolver o problema dos nossos pecados. Porque se acreditamos nisso esse será o fundamento da nossa salvação, e não nossas experiências. É acreditar na ressurreição do Senhor tanto quanto acreditamos nas coisas mais empíricas da vida, porque se acreditarmos nisso nós saberemos que a ressurreição é o destino também de todos aqueles que creem - fatos bíblicos que devem ser crenças centrais e comuns a todo crente verdadeiro e que podem ser verdadeiramente verificados pela profissão da nossa fé comum. Por isso, muito mais importante do que as experiências pessoais subjetivas é o ensino e o aprendizado das Escrituras, pois um crente verdadeiro é aquele que se conduz por uma fé consciente e não por uma fé emocional e subjetiva - até porque muita fé subjetiva é apenas emocional, falsa.
Ou seja, o critério mais importante para os crentes se reconhecerem salvos nunca será a certeza da salvação baseada num evento, mas sim a sua convicção no Evangelho, pois o verdadeiramente salvo não é aquele que olha para si - e isso é especialmente grave se esse crente passar a valorizar suas virtudes e usá-las como régua para medir as outras pessoas, tornando-se assim um hipócrita e soberbo, pecados que são odiados por Deus - mas, ao invés de olhar para si, o verdadeiro salvo é aquele que aprende a olhar para o Senhor e confiar nEle, mesmo que esse exercício de fé inclua uma persistente luta contra a sua miserável inclinação pecaminosa, numa santificação progressiva que não é igual para todo crente e que certamente implica em vitórias verdadeiras sobre o pecado e que acarretam na transformação do caráter, na mudança de costumes e de práticas, num processo gradual mas oscilante com muitos altos e baixos incluindo períodos de grande fervor intercalados por períodos de turbulência, de decepções consigo mesmo e até mesmo de dúvidas... O verdadeiro salvo, ou simplesmente um cristão verdadeiro, é aquele que sabe que ele nunca será régua moral firme o suficiente para os outros, pois somente o Senhor Jesus o é em perfeição e, apesar disso, Ele é misericordioso salvador de pecadores, ao passo que um cristão se reconhece apenas como servo, como um discípulo caminhando e aprendendo, procurando acertar mas que por vezes acaba errando, e por isso ele nunca se impõe como "santarrão", muito embora ele deseje e persiga a santidade - e a conquiste, gradualmente -, mas ele sempre aponta para o seu Senhor, Rei e Salvador como modelo perfeito para todos.
Diante disso não é improvável que dentre os salvos estejam aquelas pessoas que foram desprezadas e estigmatizadas por suas constantes lutas contra pecados nesta vida e que não serão achados entre os lavados e remidos por Cristo certos santarrões que projetam sua idolatrada moralidade e falsa santidade sobre os outros, mas que caíram no pior dos pecados (abaixo apenas da blasfêmia contra o Espírito Santo): o orgulho religioso - porque foi contra esses, muito mais do que contra os outros, que o Senhor Jesus se opôs nos Evangelhos.